Onde cada brinquedo ganha voz e a imaginação vira coragem.

A chuva começou devagar, como se o céu tivesse preguiça de acordar.
Gota por gota, ela escorregava pela janela, desenhando rios invisíveis no vidro.
Chico observava em silêncio, o queixo apoiado nas mãos.
— É… acho que o futebol de hoje foi pro espaço — murmurou.
Do lado de fora, o quintal estava todo alagado. Mas dentro de casa, Chico tinha um plano.
Correu até o baú de brinquedos e abriu a tampa com um crec.
Lá estavam eles, seus companheiros de aventuras: o Capitão Pirata, com o chapéu torto e um olhar valente; a Princesa Rosa, feita de tecido e fita brilhante; o Coelho Cenoura, com orelhas enormes e um sorriso meio torto; e o fiel cachorro de pano, Pé de Pano, sempre pronto pra tudo.
Chico os alinhou sobre o tapete como quem prepara um exército.
— Atenção, heróis do Reino do Tapete Vermelho! — anunciou, com voz solene. — Lá fora, o terrível Monstro dos Relâmpagos quer tomar nosso castelo!
O Capitão Pirata foi o primeiro a responder, com a voz que Chico fazia mais rouca:
— Arrr! Pois que ele venha! Tenho meu sabre e mil trovões de coragem!
A Princesa Rosa ergueu seu vestido de pano e falou com doçura:
— A luz do castelo está enfraquecendo, meu rei. Precisamos protegê-la!
O Coelho Cenoura pulou (com uma ajudinha da mão de Chico).
— Eu posso distrair o monstro com minhas super-orelhas!
E Pé de Pano latiu baixinho, um au-au tímido, mas cheio de bravura.
Chico sorriu.
— Então está decidido. Formem posição!
Ele empilhou almofadas, fez muralhas com cobertores e colocou a luminária dentro da fortaleza.
— A luz é o coração do castelo — explicou. — Se o monstro apagá-la, tudo se perde!
Do lado de fora, um trovão rugiu.
— BUMMMM!
O chão pareceu vibrar.
Chico ergueu a tampa da panela como escudo.
— Fiquem firmes, guerreiros! — gritou. — O inimigo está à porta!
O Capitão Pirata enfrentou o som com seu sabre de colher de pau.
— Proa firme, marujo! Nenhum trovão nos fará recuar!
A Princesa Rosa recitou uma magia:
— Que as gotas virem estrelas, e a coragem nunca se molhe!
Outro trovão.
— BUM!
A janela estremeceu. Pé de Pano se encolheu, e Chico o abraçou.
— Tá tudo bem, companheiro. O rei está aqui.
Ele olhou para o castelo de travesseiros e sentiu um orgulho enorme.
Ali dentro, ninguém tinha medo.
Minutos depois, o som da chuva ficou mais manso.
Chico deitou no meio da fortaleza, cercado pelos amigos de pano.
— Missão cumprida — sussurrou. — O Monstro dos Relâmpagos fugiu.
A Princesa Rosa repousava sobre o travesseiro, o Coelho Cenoura dormia de lado, e o Capitão Pirata parecia vigiar o horizonte.
Pé de Pano se acomodou sobre o peito de Chico, quente e leve como um cobertor.
Do lado de fora, o trovão já era só lembrança.
E dentro da fortaleza, Chico adormeceu sorrindo, sonhando com mares de nuvem e castelos de luz.
Continua…
